7.30.2011

O Pagador de Promessas



1. Aspectos estruturais

Trata-se de um texto escrito para teatro, ou seja, para ser levado ao palco, ser encenado. A peça é dividida em três atos, sendo que os dois primeiros ainda são subdivididos em dois quadros cada um. Após a apresentação dos personagens, o primeiro ato mostra a chegada do protagonista Zé do Burro e sua mulher Rosa, vindos do interior, a uma igreja de Salvador e termina com a negativa do padre em permitir o cumprimento da promessa feita. O segundo ato traz o aparecimento de diversos novos personagens, todos envolvidos na questão do cumprimento ou não da promessa e vai até uma nova negativa do padre, o que ocasiona, desta vez, explosão colérica em Zé do Burro. O terceiro ato é onde as ações recrudescem, as incompreensões vão ao limite e se verifica o dramático desfecho.

2. Enredo

Primeiro ato. Primeiro quadro.

A ação da peça tem início nas primeiras horas da manhã [4 e meia], numa praça, em frente a uma igreja, em Salvador. O personagem denominado Zé do Burro carrega uma cruz e se aloja na frente da igreja. A seu lado Rosa, sua mulher, apresentada como tendo 'sangue quente' e insatisfação sexual. Zé espera a igreja abrir para cumprir sua promessa, feita a Santa Bárbara. Aparecem no lugar, algum tempo depois, Marli e Bonitão: ela prostituta; ele, gigolô. Há uma clara relação de exploração e dependência entre eles. Encontrando Zé, Bonitão dirige-se a ele e percebe ser alguém ingênuo. Rosa, por sua vez, conversando com o gigolô, queixa-se de Zé, contando que ele, na sua promessa, dividiu suas terras com lavradores pobres. Percebendo a ingenuidade, Bonitão propõe-se a providenciar um local para Rosa descansar. Zé não só aceita, como incentiva. Saem os dois, Bonitão e Rosa, de cena.

Segundo quadro.

Aos poucos, começa o movimento ao redor da praça. Aparecem a Beata, o sacristão e o Padre Olavo, titular da igreja. Zé explica a promessa: Nicolau foi ferido com a queda de uma árvore; estando para morrer, Zé fez a promessa. O burro - Nicolau é um burro! - salva-se. Ingenuamente, Zé revela ter usado as rezas de Preto Zeferino e feito a promessa num terreiro de candomblé, a Iansã, equivalente afro de Santa Bárbara. O padre fica escandalizado. Estabelece-se o conflito. O sincretismo Iansã-Santa Bárbara, natural para Zé do burro, é um grandioso pecado para o padre. A situação agrava-se com a revelação da divisão de terras. Impasse. O padre manda fechar a igreja e proíbe o cumprimento da promessa. Zé do burro fica atônico.

Segundo ato. Primeiro quadro.

Duas horas mais tarde, já a movimentação no lugar é intensa. O Galego, dono do bar, abriu seu estabelecimento. Surgem Minha Tia, vendedora de acarajés, carurus e outras comidas típicas, Dedé Cospe-Rima, poeta popular, ao estilo repentista e o Guarda. Zé do burro quer cumprir a promessa. O Guarda tenta intervir. Rosa reaparece com 'ar culpado'. Chega o Repórter. Seguindo a linha do oportunismo sensacionalista, o repórter quer tirar vantagens da história de Zé do Burro. Quer torná-lo um mártir, para virar notícia. Enquanto isso descobre-se que Rosa transou com Bonitão. Marli faz um pequeno escândalo, denunciando a história Rosa-Bonitão.

Segundo quadro.

Três da tarde, Dedé oferece poemas para Zé, a fim de derrotar o Padre. Aparecem, em momentos subseqüentes, o capoeirista Mestre Coca e o policial, o Secreta, chamado por Bonitão, ficando ambos, por enquanto, nas cercanias. Zé começa a perder a paciência e arma uma gritaria. O padre reage. Chega o Monsenhor, autoridade da igreja, propondo a Zé uma solução: ele, Monsenhor, na qualidade de representante da Igreja, pode liberar Zé da promessa, dando-a por cumprida. Zé não aceita, dizendo que promessa foi feita à Santa e só ela poderia liberá-lo. Segue o impasse. Zé explode novamente e avança com a cruz sobre a Igreja. O padre fecha a porta. Zé, já desesperado, bate com a cruz na porta. O drama é total.

Terceiro ato.

Entardecer. Muita gente na praça e nos arredores da Igreja. Há uma roda de capoeira. O Galego, oportunista, oferece comida grátis a Zé, pois a história está trazendo movimento ao seu bar. O Secreta, no bar, avisa que a polícia prenderá Zé, ameaçando os capoeiristas, caso eles interfiram. Marli volta. Ofende Rosa, ofende Zé. O protagonista parece mudar de atitude. Resolve ir embora 'à noite'. Rosa quer ir embora já. Conta que Bonitão avisou a polícia. Retorna o repórter, que tenta montar um verdadeiro circo em torno do Zé, com o objetivo de vender o jornal. Chega Bonitão e convida Rosa para ir com ele. Zé pede a ela para ficar. Rosa hesita, a princípio, mas, em seguida, vai com Bonitão. Mestre Coca avisa Zé sobre a chegada da polícia. Zé está perplexo: 'Santa Bárbara me abandonou'. Da igreja saem o Sacristão, o Guarda, o Padre e o Delegado. Tensão da cena acentua-se. Zé ainda tenta, ingênua e inutilmente, explicar alguma coisa. Ao ser cercado, puxa uma faca. As autoridades reagem. Os capoeiristas também. Briga e confusão. De repente, um tiro espalha gente para todos os lados. Zé é mortalmente ferido. Mestre Coca olha para os companheiros, que entendem a mensagem. Os capoeiristas tomam o corpo do Zé colocam-no sobre a cruz e, ignorando padre e polícia entram na igreja, carregando a cruz.

3. Comentário

A peça de Dias Gomes tem nítidos propósitos de evidenciar certas questões socio-culturais da vida brasileira, em detrimento do aprofundamento psicológico de seus personagens. Assim, ganha força no drama a visão crítica quanto:

a] à intolerância da Igreja católica, personificada no autoritarismo do Padre Olavo, e na insensibilidade do Monsenhor convocado a resolver o problema;

b] à incapacidade das autoridades que representam o Estado - no episódio, a polícia - de lidar com questões multiculturais, transformando um caso de diferença cultural em um caso policial;

c] à voracidade inescrupulosa da imprensa, simbolizada no Repórter, um perfeito mau-caráter, completamente desinteressado no drama do protagonista, mas muito interessado na repercussão que a história pode ter;

d] ao grande fosso que separa, ainda, o Brasil urbano do Brasil rural: Zé do Burro não consegue compreender por que lhe tentam impedir de cumprir sua promessa; os padres, a polícia, a imprensa não conseguem compreender quem é Zé do Burro, sua origem ingênua, com outros códigos culturais, outras posturas. Além disso, a peça mostra as variadas facetas populares: o gigolô esperto, a vendedora de quitutes, o poeta improvisador, os capoeiristas. O final simbólico aponta em duas direções. Em primeiro lugar a morte do Zé do Burro mostra-se com fim inevitável para o choque cultural violento que se opera na peça: ninguém, entre as autoridades da cidade grande, é capaz de assimilar o sincretismo religioso tão característico de grandes camadas sociais no Brasil, especialmente no interior nordestino. Em segundo lugar, a entrada dos capoeiristas na igreja, carregando a cruz com o corpo, sinaliza para rechaçar a inutilidade daquela morte: os populares compreenderam o gesto de Zé do Burro.

Missal e Broquéis, de Cruz e Souza

Missal e Broquéis, de Cruz e Souza

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Análise da obra

A publicação das obras Missal e Broquéis em 1893, marca o início do Simbolismo no Brasil. Missal e Broquéis só não passaram despercebidas, enquanto obras, por força de uma pequena parte da crítica e de um público ainda mais restrito. O mérito só veio com o tempo e com o reconhecimento da genialidade de seu autor. Cabe lembrar que a poesia brasileira praticamente desconhecia a prosa entre suas publicações, poucos ou quase ninguém havia lido Charles Baudelaire, aliás um dos iniciadores do Simbolismo, o que obrigou a um certo estranhamento quanto a Missal. Mesmo Broquéis recebeu do público e da crítica opiniões divergentes. Foi atacado por José Veríssimo e exaltado por Sílvio Romero, e pareceu chocar os leitores acostumados com a poesia parnasiana, nitidamente dominadora naquele momento.

Os poemas de Cruz e Sousa abandonam o significado explícito e lógico para buscar a ilogicidade e a sugestão vaga, regras, aliás, de fundamental importância para a poética simbolista. A multiplicidade de imagens e de sonoridades gera uma explosão sensorial no leitor, conduzindo-o a um estado de espanto geral e de choque diante do inusitado. As imagens, aparentemente inconciliáveis, múltiplas e repetidas, despertam um psiquismo intenso. Essa fusão de abstrações cria o sensorialismo simbolista e faz brotar a novidade.

Alguns textos comentados de Missal

Os poemas de Missal são escritos em prosa. O Simbolismo ainda é algo latente nessas realizações, não atingindo o grau de musicalidade, plasticidade e sugestão desejados. Por ser ainda a primeira obra de Cruz e Sousa na linha simbolista, não consegue atingir a sublimidade e a alquimia verbal de suas realizações posteriores. Vale mais como registro do que realmente como referência do Simbolismo no Brasil. Mesmo que saibamos da influência da poesia em prosa de Charles Baudelaire sobre Cruz e Sousa, são raros os momentos de genialidade dessa obra, se compararmos com os textos do grande mestre francês. Essas influências são ainda tênues, mais frutos da paixão do que da inspiração irmanada. Falta, sem dúvida, o brilho e os rasgos da impetuosidade baudelairiana a Cruz e Sousa nesses poemas. Essa força só poderá ser melhor admirada, indiscutivelmente, nos versos de Broquéis.

Ainda que não nos caiba julgar os motivos que levaram à adoção de Missal, não nos parece coerente essa decisão dos examinadores que, ao contrário de atrair os jovens leitores. tende a afastá-los ainda mais desse grande poeta que é Cruz e Sousa.

Texto 1 - Oração ao Sol

Sol, rei astral, deus dos sidéreos Azuis, que fazes cantar de luz os prados verdes, cantar as águas! Sol imortal, pagão, que simbolizas a Vida, a Fecundidade! Luminoso sangue original que alimentas o pulmão da Terra, o Seio virgem da Natureza! Lá do alto zimbório catedralesco de onde refulges e triunfas, ouve esta Oração que te consagro neste branco Missal da excelsa Religião da Arte, esmaltado no marfim ebúrneo das iluminuras do Pensamento.

Permite que um instante repouse na calma das Idéias, concentre cultualmente o Espírito, como no recolhido silêncio de igrejas góticas, e deixe lá fora, no rumor do mundo, o tropel infernal dos homens ferozmente rugindo e bramando sob a cerrada metralha acesa das formidandas paixões sangrentas.

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Ó radiante orientalista do firmamento! Supremo artista grego das formas indeléveis e prefulgentes da Luz! pelo exotismo asiático desses deslumbramentos, pelos majestosos cerimoniais da basílica celeste a que tu presides, que esta Oração vá, suba e penetre os etéreos paços esplendorosos e lá para sempre vibre, se eternize através das forças firmes, num som álacre, cantante, de clarim proclamador e guerreiro.

Comentários: Esse longo poema em prosa representa uma espécie de ‘profissão de fé’ dentro da obra de Cruz e Sousa, já que estabelece muitíssimo bem sua intenção simbolista. O mesmo ocorre no poema de abertura de Broquéis, Antífona”. E interessante destacar que essa invocação do sol tem a força de uma oração ou pedido para realizar seus poemas sem a interferência daqueles que detêm o poder sobre o mundo dos homens e das artes. O mesmo ocorre na epígrafe de Baudelaire utilizada em Broquéis.

Texto 2 - Os Cânticos

No templo branco, que os mármores augustos e as cinzeluras douradas esmaltam e solenizam com resplandecência, dentre a profusão suntuosa das luzes, suavíssimas vozes cantam.

Coros edênicos inefavelmente desprendem-se de gargantas límpidas, em finas pratas de som, que parecem dar ainda mais brancura e sonoridade à vastidão do templo sonoro.

E as vozes sobem claras, cantantes, luminosas como astros.

Cristos aristocráticos de marfim lavrado, como fidalgos e desfalecidos príncipes medievos apaixonados, emudecem diante dos Cânticos, da grande exaltação de amor que se desprende das vozes em fios sutilíssimos de voluptuosa harmonia.

O seu sangue delicado, ricamente trabalhado) em rubim, mais viso, mais luminoso e vermelho fulge ao clarão das velas.

Dir-se-ia que esse rubim de sangue palpita, aceso mais intensamente no colorido rubro pele luxúria dos Cânticos, que despertam, ciliciando, todas as virgindades da Carne.

Fortes, violentas rajadas de sons perpassam convulsamente nos violoncelos, enquanto que as vozes se elevam, sobem, num veemente desejo, quase impuras, maculadas quase, numa intenção de nudez.

E, através da volúpia das sedas e damascos pesados que ornamentam o templo, das luzes adormentadoras. dos perturbadores incensos, da opulência festiva dos paramentos dos altares e dos sacerdotes, das egrégias músicas sacras, sente-se impressionativamente pairar em tudo a volúpia maior - a volúpia branca dos Cânticos.

Comentários: Apesar de empregar o misticismo e algumas palavras do vocabulário simbolista, o texto mostra nítida inspiração parnasiana. principalmente por sua construção de imagens mais precisas e detalhadas. Em certos momentos, sentimo-nos diante de um poema de construção clássica, até mesmo pelo rigor descritivo e pela economia de figuras.

Estrutura de Broquéis

Broquéis apresenta 54 poemas, sendo 47 sonetos. Os versos são decassílahos rimados, variando-se o esquema de rimas.

Esboços de atmosfera vaga: Em Sonhos, Monja, Carnal e Místico, Lua, Primeira Comunhão, Velhas Tristezas, Vesperal, Cristais, Sinfonias do Ocaso, Música Misteriosa, Ângelus, Sonata, Incensos e Luz Dolorosa. Nesses poemas há predominância do branco, imagens cósmicas e uma musicalidade etérea.

Metalinguagem

Antífona, Siderações, Clamando, Sonho Branco, Torre de Ouro, Sonhador, Foederis Arca, Post Mortem, Supremo Desejo e Tortura Eterna. Nesses poemas há a tematização do ato poético ou da condição do poeta. Em todos eles, busca-se valorizar as intenções da poesia simbolista: vaga, abstrata, musical, sensorial.

Erotismo sensual

Lésbia, Múmia, Lubricidade, Braços, Encarnação, Tulipa Real, Dança do Ventre, Dilacerações, Sentimentos Carnais e Serpente de Cabelos. Em Cruz e Sousa, o erotismo é algo densamente carnal, de natureza física. Com isso, as imagens de sensualidade perdem algumas vezes o caráter vago da poesia simbolista para aproximarem-se mais do Expressionismo, devido mesmo a certas deformações e acumulações metafóricas. Sua influência, entretanto, é Baulelaire.

Erotismo espiritual

Canção da Formosura, Beleza Morta, Deusa Serena, Flor do Mar, Alda e Lembranças Apagadas. Nesses poemas, o amor é platonizado, ganhando dimensão mais etérea e abstrata. Os tons bruscos e rudes do erotismo sensual desvanecem se, atingindo luminosidades e retomando os matizes variados do branco.

Retratos extravagantes

Satã, Afra, Judia, Tuberculosa, Regenerada, Rebelado e Majestade Caída. Esses poemas mostram imagens algumas vezes radicalmente fortes, traços de anormalidade ou extravagância são acentuados. A exceção fica por conta de “Tuberculosa”, cuja composição é nitidamente simbolista. Os demais denotam influência parnasiana.

Visões místicas

Cristo de Bronze, Regina Coeli, Noiva da Agonia, Visão da Morte e Aparição. Esse grupo de poemas traduz claramente o misticismo simbolista.

Alegorias pessimistas

A Dor e Acrobata da Dor. Os dois poemas mostram tendência parnasiana. O segundo emprega “sintaxe meio clássica” e talvez seja a composição mais parnasiana de Broquéis, o que em nada perturba o seu virtuosismo sonoro.

Análise de Broquéis

Primeiramente, devemos levar em conta que Cruz e Sousa foi chamado pelo crítico Tristão de Ataíde de “poeta solar”, por causa da predominância do branco e de claridades em seus poemas. Usando e abusando de substantivos e adjetivos que denotam a presença quase constante do branco em todos os seus matizes, Cruz e Sousa deixou patente sua obsessão por essa cor, chegando, em certos momentos, a tornar evidente para os leitores a sugestão de vazio. Essa era a pretensão do Simbolismo enquanto estética: chegar ao vago absoluto, à imprecisão completa. Os versos abaixo, que abrem o livro, são um bom exemplo disso:

"Ó Formas alvas, brancas. Formas claras

De luares, de neves, de neblinas!...

Ó Formas vagas, tinidas, cristalinas...

Incensos dos turíbulos das aras..." (Antífona)

Afinal, do que estará o poeta falando? De nada, já que sua intenção é justamente criar o inusitado, a sugestão absoluta do branco. Para tanto, emprega redundantemente expressões e palavras que sugerem clareza: “alvas”, “brancas”, “claras”, “de luares”, “de neves”, “de neblinas”. Deixa ainda mais patente a busca do vago em: “formas vagas”, “fluidas”, “cristalinas”. “Incensos”. Já transparece aqui outro recurso predominante na poética desse simbolista, que é o emprego de vocabulário das liturgias religiosas: “turíbulos” e “aras”, ou seja, vasos utilizados nas celebrações para se queimar incenso e os próprios altares dessas liturgias.

Aproveitaremos os mesmos versos para falarmos da musicalidade, outra característica simbolista. A musicalidade desses versos nasce de três decorrências:

A primeira é aparente - o emprego das rimas (esquema ABBA), que brota da influência clássica do Parnasianismo e que não foi abandonada por Cruz e Sousa quanto aos aspectos formais do poema. Devemos notar que ele emprega rimas ricas. No caso, adjetivo e substantivo, entre o primeiro e o quarto versos, e substantivo e adjetivo, entre o segundo e terceiro versos.

A segunda nasce do emprego de uma figura de construção, a assonância, muito utilizada no Simbolismo, que consiste na repetição da vogal, no caso a vogal “a”, como podemos perceber no primeiro verso: “Ó Formas alvas, brancas, Formas claras”

A terceira, bem menos evidente que as demais, surge com o emprego dos versos harmônicos, que consistiriam num processo de justaposição cumulativa de imagens e “de sons simultâneos, de palavras isoladas que vibram sem conexão sintática”. Os versos que compõem a estrofe não apresentam verbos, são frases nominais, que parecem se unir numa densa imagem ilógica, abstrata, mas que mantêm uma cadência sonora. Cada expressão ou palavra parece vibrar e ganhar sentido no termo seguinte, criando uma densa melodia. Esse esquema de construção predomina em Broquéis.

Outros temas representam verdadeira obsessão em Cruz e Sousa e, por conseqüência em Broquéis: amor, morte, sonho, fantasia, quimera, mulher, crepúsculo, lírio, noite, música. O amor e a morte são evidentes heranças românticas, já que o Simbolismo representa uma retomada do “mal do século”. Entretanto, encontramos uma predominância do erotismo sobre o platonismo. Em vários momentos a imagem de pureza da mulher não consegue evitar que o eu-lírico extrapole seus idealismos e exponha seus desejos carnais. Símbolo maior desse erotismo, que povoa a poesia de Cruz e Sousa, encontramos em Lésbia, sua representação máxima:

“Cróton selvagem, tinhorão lascivo,

Planta mortal, carnívora, sangrenta.

Da tua carne báquica rebenta

A vermelha explosão de um sangue vivo.”

Nem sempre, porém, a mulher é vista como um ser carnal e corpóreo, sendo algumas vezes representada pela feminilidade da lua, por exemplo:

“Então, ó Monja branca dos espaços,

Parece que abres para mim os braços,

Fria, de joelhos, trêmula, rezando...” (Monja)

“E ondulam névoas. cetinosas rendas

De virginais, de prónubas alvuras...

Vagam aladas e visões e lendas

No flórido noivado das Alturas...(Lua)

Essa tendência para a personificação ou prosopopéia aparece também em vários outros poemas.

Outra característica de Broquéis é o emprego da sinédoque, já que o poeta utiliza partes do corpo humano para representá-lo inteiro:

“Braços nervosos, brancas opulências.

Brumais brancuras, fúlgidas brancuras,

Alvuras castas, virginais alvuras,

Lactescências das raras lactescências.” (Braços)

Outro elemento importante em toda a obra é o misticismo, que se apresenta numa intensidade quase dominante na maior parte dos poemas. A alma do poeta parece repleta de uma mística que segue o ritual de suas imagens, quase sempre aéreas, voláteis. Mesmo o elemento mundano sofre profunda transforrnação, ganhando leveza e brilho. Uma misteriosa música parece dominar os sentidos, refletindo os acordes de um hino religioso. Por isso os poemas assemelham-se tanto, são compassos de uma mesma música que vai conduzindo o leitor pelo universo mais íntimo do artista. Mesmo o vocabulário, tantas vezes repetido denota que o acorde de um verso, de um poema, parece continuar em outro, tantas vezes repetido, como num ladainha que vai ganhando intensidade e novas cores. Esse processo reiterativo é enfim um recurso formal que possibilita o entendimento de Broquéis.

“Pelos raios fluídicos, diluentes

Dos Astros, pelos trêmulos velários,

Cantam Sonhos de místicos templários,

De ermitões e de ascetas reverentes...

Cânticos vagos, infinitos, aéreos

Fluir parecem dos Azuis etéreos.

Dentre os nevoeiros do luar tinindo...” (Música Misteriosa)

Em diversos poemas, encontramos a presença da metalinguagem, ou seja, o discurso poético voltado ao seu próprio fazer. Tomamos como exemplo uma estrofe de Antífona que é uma espécie de profissão de fé do Simbolismo:

“Que o pólen de ouro dos mais finos astros

Fecunde e inflame a rima clara e ardente...

Que brilhe a correção dos alabastro

Sonoramente, luminosamente.”

Toda essa inventividade lingüística gerou um certo espanto no público da época e ainda vem arrancando exclamações dos leitores incrédulos diante dessa polifonia simbolista. Mas, estejamos certos de que é do novo que brota a modernidade, é do espanto que nascem a genialidade e a criatividade e é de tudo isso que germina a poesia etérea e misteriosa de Cruz e Sousa.

Alguns textos comentados de Broquéis

Antífona

Ó Formas alvas, brancas. Formas claras

De luares, de neves, de neblinas!...

Ó Formas vagas, fluidas, cristalinas...

Incensos dos turíbulos das aras...

Formas do Amor, constelarmente puras,

De Virgens e de Santas vaporosas...

Brilhos errantes, mádidas frescuras

E dolências de lírios e de rosas...

Indefiníveis músicas supremas.

Harmonias da Cor e do Perfume

Horas do Ocaso, trêmulas, extremas.

Réquiem do Sol que a Dor da Luz resume...

Visões, salmos e cânticos serenos,

Surdinas de órgãos flébeis, soluçantes...

Dormências de volúpicos venenos

Sutis e suaves, mórbidos, radiantes...

Infinitos espíritos dispersos,

Inefáveis, edênicos, aéreos,

Fecundai o Mistério destes versos

Com a chama ideal de todos os mistérios.

Do Sonho as mais azuis diafaneidades

Que fuljam, que na Estrofe se levantem

E as emoções, todas as castidades

Da alma do Versos, pelos versos cantem.

Que o pólen de ouro dos mais finos astros

Fecunde e inflame a rima clara e ardente...

Que brilhe a correção dos alabastros

Sonoramente, luminosamente.

Forças originais, essência, graça

De carnes de mulher, delicadezas...

Todo esse eflúvio que por ondas passa

Do Éter nas róseas e áureas correntezas...

Cristais diluídos de clarões álacres,

Desejos, vibrações, ânsias, alentos,

Fulvas vitórias, triunfamentos acres,

Os mais estranhos estremecimentos...

Flores negras do tédio e flores vagas

De amores vãos, tantálicos, doentios...

Fundas vermelhidões de velhas chagas

Em sangue, abertas, escorrendo em rios...

Tudo! vivo e nervoso e quente e forte,

Nos turbbilhões quiméricos do Sonho,

Passe, cantando, ante o perfil medonho

E o tropel cabalístico da Morte...

O poema em versos decassílabos dispostos em quadras (ou quartetos) é uma espécie de "profissão de fé" da poesia simbolista, verdadeiro texto-programa das intenções de Cruz e Sousa. Nele encontramos os objetivos da poética decadentista, tais como o absolutamente vago, a musicalidade, o misticismo, a evasão e o pessimismo. O título significa um versículo recitado antes de um salmo, o que por si só já traduz o misticismo do autor. O poema, como um todo, segue a proposta de Verlaine de apenas sugerir e nunca nomear os objetos. Está também presente a metalinguagem, já que há uma verdadeira exaltação à forma e à função da palavra. Estão ainda presentes a sinestesia, as aliterações e as assonâncias. A predominância de frases nominais sugere a presença dos versos harmônicos, já que o primeiro verbo só aparecerá no final da terceira estrofe. O "poeta solar" já deixa também evidente sua predileção exagerada pelo branco, sugerido na primeira estrofe em todos os seus matizes.

Texto 2 - Siderações

Para as Estrelas de cristais gelados

As ânsias e os desejos vão subindo,

Galgando azuis e siderais noivados

De nuvens brancas a amplidão vestindo...

Num cortejo de cânticos alados

Os arcanjos. cítaras ferindo,

Passam, das vestes nos troféus prateados,

As asas de ouro finamente abrindo...

Dos etéreos turíbulos de neve

Claro incenso aromal. límpido e leve.

Ondas nevoentas de Visões levanta...

E as ânsias e os desejos infinitos

Vão com os arcanjos formulando ritos

Da eternidade que nos Astros canta...

Comentários: O soneto em versos decassílabos representa bem o caráter vago da poesia de Cruz e Sousa, que procura construir através do cruzamento de sensações (sinestesias) imagens sugestivas do céu. O caráter abstrato é obtido pelo emprego da visão (emprego de cores e luminosidades), audição (sons de instrumentos e cânticos) e olfato (aroma do incenso). É interessante notarmos que o ritmo do poema é lento, acompanhando uma espécie de bailado em forma ascendente até soltar-se completamente no último verso.

Suspiros Poéticos e Saudades, de Gonçalves de Magalhães

Suspiros Poéticos e Saudades, de Gonçalves de Magalhães

A obra Suspiros Poéticos e Saudades, publicada em 1836, foi considerada a obra inaugural do Romantismo no Brasil. O autor procurou criar e consolidar uma literatura nacional para o país. É dividida em duas partes: "suspiros poéticos" e “saudades”.

A primeira parte é constituída de 43 poemas sobre os mais diversos temas, tais como a própria poesia, o cristianismo, a mocidade, a fantasia, ou ainda diversas impressões sobre lugares, fatos e figuras da história. Em grande parte dos poemas há indicações de onde foram escritos, fazendo com que possamos relacionar a partir daí os diversos países nos quais o poeta esteve: Brasil, Bélgica, Suíça, França, Itália. É uma espécie de literatura poética de viagens, que, na época, deve ter fascinado muito aos jovens brasileiros. Estes, em sua grande maioria, não podiam fazer o que fizera o autor dos Suspiros Poéticos, isto é, escrever em Waterloo um poema sobre Napoleão, em Roma um poema sobre as ruínas daquela cidade, em Ferrara uns versos sobre o cárcere de Tasso.

O livro de Magalhães, se não primava pela qualidade dos versos, unia a poesia e a experiência, a arte e a vivência, sendo, enfim, o exemplo maior do versejar ao gosto da aventura, do novo, do exótico, ao mesmo tempo que expressava a experiência do Eu em contato direto com a cultura erudita européia, sacralizada aos olhos dos românticos brasileiros.

Também a experiência pessoal, o contato com os amigos, faz-se presente no livro. O poema A meu amigo D. J. G. de Magalhães provavelmente não foi escrito pelo próprio Magalhães, já que foi a ele endereçado. Teria sido composto, possivelmente, por Manuel de Araújo Porto Alegre, pois, no livro, o poema que se segue intitula-se Em resposta a meu amigo M. de Araújo Porto Alegre, sugerindo um diálogo entre os dois textos. Mas nada aí está muito claro, principalmente para o leitor leigo, que desconhece o hábito de os românticos trocarem esse tipo de “correspondência” poética nas próprias obras. Teria sido bem-vinda uma nota explicativa, por parte de Sousa da Silveira ou mesmo da parte dos editores posteriores, sobre a autoria do poema.

A segunda parte é dedicada, como o próprio título declara, à saudade, evocando em 12 poemas a pátria, a família, os amigos, enfim, pessoas, fatos e lugares caros ao poeta e dele apartados. Todavia, segundo Antonio Candido, o saudosismo de Magalhães não transcende à saudade do “menino manhoso longe da mãe”. De qualquer modo, o tema ganhou larga aceitação no romantismo brasileiro, e muitos irão chorar a falta da mãe genitora, da mãe pátria, da amada, do amigo, etc.

O primeiro manifesto teórico do nosso Romantismo é o Prólogo de Suspiros Poéticos e Saudades:

Suspiros Poéticos e Saudades

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(Prefácio aos Suspiros Poéticos e Saudades)

Pede o uso que se dê um prólogo ao Livro, como um pórtico ao edifício; e como este deve indicar por sua construção a que Divindade se consagra o templo, assim deve aquele designar o caráter da obra. Santo uso de que nos aproveitamos, para desvanecer alguns preconceitos, que talvez contra este Livro se elevem em alguns espíritos apoucados.

É um Livro de Poesias escritas segundo as impressões dos lugares; ora assentado entre as ruínas da antiga Roma, meditando sobre a sorte dos impérios; ora no cimo dos Alpes, a imaginação vagando no infinito como um átomo no espaço, ora na gótica catedral, admirando a grandeza de Deus, e os prodígios do Cristianismo; ora entre os ciprestes que espalham sua sombra sobre túmulos; ora enfim refletindo sobre a sorte da Pátria, sobre as paixões dos homens, sobre o nada da vida. São poesias de um peregrino, variadas como as cenas da Natureza, diversas como as fases da vida, mas que se harmonizam pela unidade do pensamento, e se ligam como os anéis de uma cadeia; poesias d'alma, e do coração, e que só pela alma e o coração devem ser julgadas.

Quem ao menos uma vez separou-se de seus pais, chorou sobre a campa de um amigo, e armado com o bastão de peregrino, errou de cidade em cidade, de ruína em ruína, como repudiado pelos seus; quem no silêncio da noite, cansado de fadiga, elevou até Deus uma alma piedosa, e verteu lágrimas amargas pela injustiça, e misérias dos homens; quem meditou sobre a instabilidade das coisas da vida, e sobre a ordem providencial que reina na história da Humanidade, como nossa alma em todas as nossas ações; esse achará um eco de sua alma nestas folhas que lançamos hoje a seus pés, e um suspiro que se harmonize com o seu suspiro.

Para bem se avaliar esta obra, três coisas releva notar: o fim, o gênero, e a forma.

O fim deste Livro, ao menos aquele a que nos propusemos, que ignoramos se o atingimos, é o de elevar a Poesia à sublime fonte donde ela emana, como o eflúvio d'água, que da rocha se precipita, e ao seu cume remonta, ou como a reflexão da luz ao corpo luminoso; vingar ao mesmo tempo a Poesia das profanações do vulgo, indicando apenas no Brasil uma nova estrada aos futuros engenhos.

A Poesia, este aroma d'alma, deve de contínuo subir ao Senhor; som acorde da inteligência deve santificar as virtudes, e amaldiçoar os vícios. O poeta, empunhando a lira da Razão, cumpre-lhe vibrar as cordas eternas do Santo, do Justo, e do Belo.

Ora, tal não tem sido o fim da maior parte dos nossos poetas; e o mesmo Caldas, o primeiro dos nossos líricos, tão cheio de saber, e que pudera ter sido o reformador da nossa Poesia, nos seus primores d'arte, nem sempre se apoderou desta idéia. Compõe-se uma grande parte de suas obras de traduções; e quando ele é original causa mesmo dó que cantasse o homem selvagem de preferência ao homem civilizado, como se aquele a este superasse, como se a civilização não fosse obra de Deus, a que era o homem chamado pela força da inteligência com que a Providência dos mais seres o distinguira!

Outros apenas curaram de falar aos sentidos; outros em quebrar todas as leis da decência!

Seja qual for o lugar em que se ache o poeta, ou apunhalado pelas dores, ou ao lado de sua bela, embalado pelos prazeres; no cárcere, como no palácio; na paz, como sobre o campo da batalha, se ele é verdadeiro poeta, jamais deve esquecer-se de sua missão, e acha sempre o segredo de encantar os sentidos, vibrar as cordas do coração, e elevar o pensamento nas asas da harmonia até às idéias arquétipas.

O poeta sem religião, e sem moral, é como o veneno derramado na fonte, onde morrem quantos aí procuram aplacar a sede.

Ora, nossa religião, nossa moral é aquela que nos ensinou o Filho de Deus, aquela que civilizou o mundo moderno, aquela que ilumina a Europa, e a América e só este bálsamo sagrado devem verter os cânticos dos poetas brasileiros.

Uma vez determinado e conhecido o fim, o gênero se apresenta naturalmente. Até aqui, como só se procurava fazer uma obra segundo a Arte, imitar era o meio indicado: fingida era a inspiração, e artificial o entusiasmo. Desprezavam os poetas a consideração se a Mitologia podia, ou não, influir sobre nós. Contanto que dissessem que as Musas do Hélicon os inspiravam, que Febo guiava seu carro puxado pela quadriga, que a Aurora abria as portas do Oriente com seus dedos de rosas, e outras tais e quejandas imagens tão usadas, cuidavam que tudo tinham feito, e que com Homero emparelhavam; como se pudesse parecer belo quem achasse algum velho manto grego, e com ele se cobrisse. Antigos e safados ornamentos, de que todos se servem, a ninguém honram!

Quanto à forma, isto é, a construção, por assim dizer, material das estrofes, e de cada cântico em particular, nenhuma ordem seguimos; exprimindo as idéias como elas se apresentaram, para não destruir o acento da inspiração; além de que, a igualdade dos versos, a regularidade das rimas, e a simetria das estâncias produz uma tal monotonia, e dá certa feição de concertado artificio que jamais podem agradar. Ora, não se compõe uma orquestra só com sons doces e flautados; cada paixão requer sua linguagem própria, seus sons imitativos, e períodos explicativos.

Quando em outro tempo publicamos um volume das Poesias da nossa infância, não tínhamos ainda assaz refletido sobre estes pontos, e em quase todas estas faltas incorremos; hoje, porém, cuidamos ter seguido melhor caminho. Valha-nos ao menos o bom desejo, se não correspondem as obras ao nosso intento; outros mais mimosos da Natureza farão o que não nos é dado.

Algumas palavras acharão neste Livro que nos Dicionários Portugueses se não encontram; mas as línguas vivas se enriquecem com o progresso da civilização, e das ciências, e uma nova idéia pede um novo termo.

Eis as necessárias explicações para aqueles que lêem de boa fé, e se aprazem de colher uma pérola no meio das ondas; para aqueles, porém, que com olhos de prisma tudo decompõem, e como as serpentes sabem converter em veneno até o néctar das flores, tudo é perdido; o que poderemos nós dizer-lhes?.. . Eis mais uma pedra onde afiem suas presas; mais uma taça onde saciem sua febre de escárnio.

Este Livro é uma tentativa, é um ensaio; se ele merecer o público acolhimento, cobraremos ânimo, e continuaremos a publicar outros que já temos feito, e aqueles que fazer poderemos com o tempo.

É um novo tributo que pagamos à Pátria, enquanto lhe não oferecemos coisa de maior valia; é o resultado de algumas horas de repouso, em que a imaginação se dilata, e a atenção descansa, fatigada pela seriedade da ciência.

Tu vais, oh Livro, ao meio do turbilhão em que se debate nossa Pátria; onde a trombeta da mediocridade abala todos os ossos, e desperta todas as ambições; onde tudo está gelado, exceto o egoísmo: tu vais, como uma folha no meio da floresta batida pelos ventos do inverno, e talvez tenhas de perder-te antes de ser ouvido, como um grito no meio da tempestade.

Vai; nós te enviamos, cheio de amor pela Pátria, de entusiasmo por tudo o que é grande, e de esperanças em Deus, e no futuro.

Adeus!

Paris, julho de 1836.

Canaã;de Graça Aranha

Canaã
sobre Resumos Literarios por Algo Sobre
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[Graça Aranha]

I- O Autor:

José Pereira da Graça Aranha nasceu em São Luís do Maranhão a 21/06/1848, tendo sido juiz e diplomata. Uma influência intelectual decisiva em sua obra é a de Tobias Barreto, que conheceu em 1882 enquanto cursava Direito no Recife. Formou-se em direito seis anos depois e mais quatro anos após exerceu o caso de juiz em Porto do Cachoeiro, ES, onde tomou conhecimento dos fatos que inspiraram Canaã. Seu primeiro trabalho foi o prefácio de um livro em 1894, quando já morava no RJ. Dois anos depois, em 1896, participou da fundação da ABL, mesmo nunca tendo publicado nenhuma obra literária; tal fato só foi possível porque seu amigo Joaquim Nabuco lhe foi 'fiador literário' até 1902, ano da publicação de Canaã. Partiu em 1899 com o mesmo Nabuco para Europa como diplomata. Em 1911 sua peça Malazarte foi encenada com sucesso em Paris. Aposentou-se da diplomacia em 1921, participou da Semana de Arte Moderna de 1922 e abandonou a ABL 1924. Não é considerado modernista porque sua única obra 'modernista', A viagem maravilhosa, de 1939, é feita em um estilo extremamente artificial. Morreu logo antes de publicar sua autobiografia, O meu próprio romance, em 1931. Sua única obra de significado verdadeiro é Canaã, donde provêm as passagens que seguem.

II- Obra:

Milkau, alemão, recém-chegado, o a uma colônia de imigrantes europeus, no Espírito Santo, aluga um cavalo para ir do Queimado à cidade de Porto do Cachoeiro. Junto com ele vai o guia, um menino de 9 anos, filho de um alugador de animais, no Queimado.

O imigrante observa a paisagem e, ao passar por uma fazenda abandonada, entregue aos poucos e pobres escravos, nota o ritmo daquela gente desamparada. Finalmente, chega ao sobrado do comerciante alemão, Roberto Schultz, em Cachoeiro. Na parte inferior do edifício fica o armazém, onde é negociada toda sorte de produtos, desde fazenda até instrumentos agrícolas.

É apresentado a outro imigrante, Von Lentz, filho de um general alemão. Milkau deseja arrematar um lote de terra para se estabelecer. Schultz apresenta-lhe o agrimensor, Sr.Felicíssimo, que está para ir ao Rio Doce fazer medições de terra. Milkau, desejando aí se estabelecer, decide se juntar ao agrimensor e convida o indeciso Lentz para acompanhá-lo.

Pelo caminho, Lentz e Milkau discutem a paisagem e a raça brasileiras. Milkau crê que o progresso só se dá quando os povos se misturam. Vê, na fusão das raças adiantadas com as selvagens, o rejuvenescimento da civilização. Enquanto acredita na humanidade, pensa encontrar no Brasil Canaã, 'a terra prometida'. Lentz só se ocupa da superioridade germânica, ficando enaltecido com o triunfo dos alemães sobre os mestiços. Para ele, a mistura gera uma cultura inferior, uma civilização de mulatos que serão sempre escravos e viverão em meio a lutas e revoltas. Acrescenta que está no Brasil, porque o estava forçando a se casar com a filha de um general, amigo do pai. Preferiu começar vida nova, longe dos deveres e obrigações impostos por sua sociedade. Milkau conta-lhe que também não encontrava graça no viver, ansiava por uma vida mais independente, em que pudesse dar vazão à sua individualidade.

À noite, reúnem-se a Felicíssimo e ouvem de alguns homens da terra e dos trabalhadores alemães lendas, evocando o Reno e despertando saudades. Os planos dos dois imigrantes diferem; Milkau deseja manter seu pedaço de terra e anseia por uma justiça perfeita sem ganâncias ou lutas. Lentz está determinado a ampliar sua propriedade, ter muitos trabalhadores sob seu comando. Sonha com o domínio do branco sobre o mulato, numa confirmação de seu poder.

Após as medidas tomadas por Felicíssimo, Milkau pode levantar sua casa e Lentz deixa-se ficar, triste e angustiado, incapaz de abandonar o companheiro, dedicando-se às viagens e compras da casa. No trajeto, encontra-se sempre com um velho colono alemão taciturno, em companhia de seus cães ferozes, mas fiéis. Mais tarde, encontrará esse velho morto em casa, guardado pelos animais e devorado pelos urubus.

Um dia, ao retornar de Santa Teresa, Lentz traz a notícia de que, em Jequitibá, o novo pastor vai celebrar seu primeiro serviço. Os colonos preparam uma festa e Milkau resolve juntar-se a eles como forma de se familiarizar com os costumes do povo. Pelo caminho, os amigos encontram famílias inteiras de colonos. As mulheres se vestem com o modelo usado na partida para a nova terra, sendo possível fixar, pelo vestuário, a época de cada imigração.

Felicíssimo os convida para, depois do culto, festejarem no sobrado de Jacob Müller.

Ouvem música e vêem o povo dançando. Milkau diz a Lentz que era isso o que buscava: uma vida simples em meio à gente simples, matando o ódio e esquecendo da dor. Os homens de outras terras estavam possuídos pelo demônio, devastando o mundo. Lentz vê em tudo aquilo uma existência vazia e inútil.

Milkau conhece, nesse dia, no sobrado de Müller, uma colona, Maria Perutz, que não consegue mais esquecer o encontro com o rapaz. A história de Maria é triste e solitária. O pai morreu antes que ela pudesse conhecê-lo. A mãe viúva, criada da casa do alemão Augusto Kraus, logo falece e Maria fica sob os cuidados de Augusto, seu verdadeiro amigo. Moravam com o velho, seu filho, a nora Ema e o neto, Moritz Kraus. Repentinamente, Kraus falece e a situação na casa de Maria se modifica.

Ema e o esposo decidem separar a moça do filho, temendo uma aproximação amorosa.

A família quer ver Moritz casado com a rica Emília Schenker e o enviam para longe de Jequitibá. O rapaz parte com certa alegria, deixando Maria desgostosa, pois os dois já eram amantes.

Franz Kraus é procurado por um Oficial de Justiça que, desejando saber porque a morte do velho não foi notificada, passa-lhe um documento sobre a necessidade de arrolamento dos bens de Augusto Kraus. Solicita que lhe prepare alojamento e comida para cinco pessoas, pois darão plantão em sua casa, recebendo todos os que estiverem na mesma situação de Franz.

O grupo se instala na casa e passa a chamar os colonos, amedrontando-os com extorsões e violências. Após a visita, cobram de Franz Kraus a alta importância de quatrocentos mil réis, além de demonstrarem certo interesse em Maria, notadamente o procurador Brederodes. Kraus sente-se ultrajado e roubado. A vida de Maria por essa época piora. Dia-a-dia, teme que seu estado se revele, por isso aguarda desesperadamente o retorno de Moritz para lhe contar sobre o filho que espera.

Os pais do rapaz não tardam perceber o que se passa. Vendo-a mover-se pela casa languidamente, sentem ódio e temem pelo casamento do filho. Passam o dia a cochichar, a tramar para se verem livres dela. Tratam-na com mais rigor, não lhe dão quase comida, dobram-lhe os trabalhos. Resignada, Maria resiste para desespero dos velhos. Uma manhã, trêmula e exausta deixa cair um prato. Encolerizada, Ema grita para que ela abandone a casa. O marido ameaça-lhe com um pedaço de madeira.

Amedrontada, arruma uma trouxa e sai. Pede auxílio ao pastor, mas esse, dominado pela cunhada, docemente afasta Maria que parte para a vila em busca de abrigo.

Ao verem a triste figura, os colonos tomam-na por louca, enxotando-a. Na floresta, seu único refúgio, cai prostrada e adormece. No dia seguinte, encontra uma estalagem, onde empenha a trouxa de roupa em troca de comida e abrigo. A dona do estabelecimento lhe dá dois dias para encontrar um emprego, mas a busca é em vão.

Certo dia, na hora do almoço, Milkau reconhece Maria na estalagem. Ao saber de sua história, prontifica-se a ajudá-la, levando-a para a casa de uns colonos. A moça é aceita, mas tratada com desdém.

Um dia, trabalhando, solitariamente, no cafezal, começa a sentir as dores do parto.

Temendo retornar a casa e ser maltratada, resiste até cair e, esvaindo-se em sangue, dá luz ao bebê. Alguns porcos, que estavam nas proximidades, correm para lambê-los, mordendo o bebê que falece. A filha dos patrões chega nesse instante e, sem nada perguntar, volta a casa, dizendo que Maria tinha matado o bebê e dado a criança aos porcos. Dois dias depois, Perutz estava presa na cadeia de Cachoeiro.

A população germânica, horrorizada com o crime de Maria, prepara-se para a vingança e o exemplo. Roberto Shultz procura os mesmos representantes da Justiça que amedrontaram e extorquiram os colonos, durante o arrolamento de bens.

Pede-lhes que deixem a punição da mãe assassina para os alemães. O procurador Brederodes, ignorado por Maria na época, insiste em puni-la para que aprenda a não ser tão orgulhosa. Chama todos os alemães de hipócritas e parte, deixando Shultz desmoralizado.

Milkau fica sabendo do destino de Perutz e o encontro com ela em Cachoeiro choca-o. Maria tinha a face lívida e os olhos cintilantes dançavam ao sabor da loucura. Volta a vê-la dias seguidos, passando a ser olhado com desprezo e desconfiança, pois, talvez, fosse o amante. Repelido pelos moradores, resigna-se com a condição de inimigo, permanecendo ao lado de Maria.

Certa manhã, estando em companhia de Felicíssimo, Milkau encontra Maria, sendo levada por dois soldados para o tribunal. Em cada fase do julgamento, é apontada culpada. Milkau acompanha todas as sessões, chegando a ficar amigo do juiz Paulo Maciel. Este lhe diz que o final não será feliz, pois os depoimentos não deixam brecha para a inocência. O imigrante e Maciel aproveitam os encontros para analisar a justiça brasileira, os brasileiros e seu patriotismo.

A avaliação não é das melhores. O juiz impossibilitado de fazer justiça por uma série de circunstâncias observa que a decadência ali existente é um 'misto doloroso de selvageria dos povos que despontam para o mundo, e do esgotamento das raças acabadas. Há uma confusão geral'. Milkau crê que se pode chegar a algo melhor.

Entretanto, à medida que acompanha o definhar da amiga, vai se deixando tomar pela tristeza.

Finalmente, numa noite, Milkau tira Maria da prisão e foge com ela, correndo pelos campos em busca de Canaã, 'a terra prometida', onde os homens vivem em harmonia.

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Prosopopéia;de Bento Teixeira

Prosopopéia

Publicada em 1601, de grande valor histórico, a obra mais famosa do escritor é o poema épico, já citado, Prosopopéia. Nele, o escritor fala sobre a vida e o trabalho de Jorge de Albuquerque Coelho, terceiro donatário da Capitania de Pernambuco, e seu irmão, Duarte. É a única obra reconhecida e aceita como de sua autoria.
Embora tenha sido originalmente publicada em Lisboa, na ocasião em que Bento Teixeira ali encontrava-se encarcerado, e a despeito do autor ter nascido em Portugal, atribui-se à Prosopopeia o mérito de ser uma das primeiras obras da literatura brasileira, uma vez que Bento Teixeira estudou e fez carreira no Brasil.
Escrito em oitava rima, com noventa e quatro estrofes, o poema marcou o início do movimento barroco no Brasil. Ao que parece, a obra foi influenciada pelo poema Os Lusíadas, de Camões. Tal influência é percebida quando analisada a sintaxe, e a estrutura. A sintaxe é extremamente clássica, cheia de inversões, o que dificulta o entendimento por um leitor do século XXI. A estrutura segue de perto a da obra de Camões, como se percebe já de inicio pela existência de proposição (Onde apresenta o assunto da epopéia: cantar os feitos de Jorge d'Albuquerque), invocação (quando pede ajuda do Deus cristão para compor seu texto) e dedicação (o texto é dedicado a Jorge d'Albuquerque, visando ajuda financeira).
De caráter heróico, a suposta coragem e valentia dos irmãos é narrada em decassílabos. Os acontecimentos abordados dizem respeito as terras brasileiras e a região de Alcácer-Quibir, na África, onde os irmãos teriam se destacado em uma importante batalha. Ambos, teriam também sofrido com um naufrágio, quando viajavam na nau Santo Antônio.
Trecho de Prosopopéia:
LX
Olhai o grande gozo e doce glória
Que tereis quando, postos em descanso,
Contardes esta larga e triste história,
Junto do pátrio lar, seguro e manso.
Que vai da batalha a ter victória,
O que do Mar inchado a um remanso,
Isso então haverá de vosso estado
Aos males que tiverdes já passado.

Prosopopéia;de Bento Teixeira

Prosopopéia

Publicada em 1601, de grande valor histórico, a obra mais famosa do escritor é o poema épico, já citado, Prosopopéia. Nele, o escritor fala sobre a vida e o trabalho de Jorge de Albuquerque Coelho, terceiro donatário da Capitania de Pernambuco, e seu irmão, Duarte. É a única obra reconhecida e aceita como de sua autoria.
Embora tenha sido originalmente publicada em Lisboa, na ocasião em que Bento Teixeira ali encontrava-se encarcerado, e a despeito do autor ter nascido em Portugal, atribui-se à Prosopopeia o mérito de ser uma das primeiras obras da literatura brasileira, uma vez que Bento Teixeira estudou e fez carreira no Brasil.
Escrito em oitava rima, com noventa e quatro estrofes, o poema marcou o início do movimento barroco no Brasil. Ao que parece, a obra foi influenciada pelo poema Os Lusíadas, de Camões. Tal influência é percebida quando analisada a sintaxe, e a estrutura. A sintaxe é extremamente clássica, cheia de inversões, o que dificulta o entendimento por um leitor do século XXI. A estrutura segue de perto a da obra de Camões, como se percebe já de inicio pela existência de proposição (Onde apresenta o assunto da epopéia: cantar os feitos de Jorge d'Albuquerque), invocação (quando pede ajuda do Deus cristão para compor seu texto) e dedicação (o texto é dedicado a Jorge d'Albuquerque, visando ajuda financeira).
De caráter heróico, a suposta coragem e valentia dos irmãos é narrada em decassílabos. Os acontecimentos abordados dizem respeito as terras brasileiras e a região de Alcácer-Quibir, na África, onde os irmãos teriam se destacado em uma importante batalha. Ambos, teriam também sofrido com um naufrágio, quando viajavam na nau Santo Antônio.
Trecho de Prosopopéia:
LX
Olhai o grande gozo e doce glória
Que tereis quando, postos em descanso,
Contardes esta larga e triste história,
Junto do pátrio lar, seguro e manso.
Que vai da batalha a ter victória,
O que do Mar inchado a um remanso,
Isso então haverá de vosso estado
Aos males que tiverdes já passado.

Carta De Caminha (Pero Vaz de Caminha)

Carta De Caminha
(Pero Vaz de Caminha)

Pero Vaz de Caminha nasceu em 1450,
prestou alguns serviços à coroa portuguesa e em 1500 compôs a frota dirigida
por Pedro Álvares Cabral. Na qualidade de escrivão desta referida frota, coube
a ele redigir uma carta ao rei Dom. Manuel I comunicando-lhe sobre o
"achamento" da terra brasileira.

Neste sentido Caminha inicia seu texto,
contando-nos como fora sua viagem. A Partida se deu no dia nove de março de
1500, na manhã do dia 14 estavam entre as ilhas Canárias e no dia 22 na altura
de Cabo Verde. No dia 23, o autor nos conta sobre o único acidente da
empreitada, quando uma nau se perde sem nenhuma justificativa aparente para
isso. Com um navio a menos a viagem prossegue. No dia 21 de abril, terça feira
de páscoa, reconhecem-se sinais de terra. No dia seguinte avistam um monte e
logo em seguida terra! Caminha nos conta que o capitão nomeou a terra como
?Terra de Vera Cruz? o monte, em virtude da proximidade da Páscoa, como ?Monte
Pascual?. Dia 23, navegaram para a dita terra. Neste momento se deu o primeiro
contato entre nativos e portugueses.
Eles não se entenderam e limitaram-se a trocar presentes.

Pero Vaz de Caminha faz então, uma
atenciosa analise destes nativos, destacando os fatos que lhe chama a atenção,
como a beleza, a nudez e a inocência destes homens. Estes mesmos comentários,
sobretudo a respeito da nudez, serão repetidos diversas vezes ao longo da
carta. Caminha também fala várias vezes da necessidade de catequizar estes
homens, que ele julga ser puro e pronto para receber a fé católica. Ele
acredita que os nativos não têm nenhuma outra crença. No dia 24, os navios
menores entram em um abrigo natural, fazendo-o de porto. Cabral o chama de
?Porto Seguro?. É neste dia ainda que ocorre um dos fatos mais conhecidos do
descobrimento: Um casal indígena é convidado a subir a nau portuguesa e lá
chegando, apontam em direção a um colar de ouro e a um castiçal de prata,
apontando em seguida a terra. Esses movimentos foram interpretados por Caminha
como sendo indicativo da presença de ouro e prata naquela terra.

No dia seguinte os demais navios também
entram no Porto Seguro e no dia 26, sendo domingo de Páscoa, ocorre a primeira
missa. Esta missa foi assistida por todos os integrantes da frota portuguesa e
pelos índios da região. Nos quatro dias posteriores os marinheiros ajudados
pelos nativos preparam os navios para seguir viagem. Paralelamente, uma cruz de
madeira foi feita pelos carpinteiros da frota, fato este que muito atraiu a
curiosidade dos índios, segundo caminha mais pelos instrumentos de ferro usados
(desconhecidos para os nativos), que pela cruz em si.

No
dia 1º é celebrada uma segunda missa. Desta vez, além da missa foi colocado
junto a uma árvore a tal cruz de madeira. Os portugueses, a mando de Cabral, se
ajoelham e beijaram a cruz. Com isso queriam mostrar aos índios a dedicação e
submissão que tinham para com aquele ícone da religião católica. No dia
seguinte partiram, deixando pra trás, além da cruz, dois homens condenados à
morte com a missão de entender as línguas e costumes daquela região. Caminha
encerra seu discurso fazendo um apelo pessoal ao rei, para que ele interceda
junto a seu genro, Jorge de Osório, que se encontrava preso na ilha de São Tomé.


A carta de Pero Vaz de Caminha é de um valor
histórico incalculável! É com ela que hoje podemos saber uma série de elementos
sobre a situação do Brasil a época do descobrimento, como é o caso do
comportamento dos índios. A simpatia inegável que Caminha revela pelos
primeiros habitantes de nossa terra permite-nos vê-lo como um exemplo do
humanista da época, intelectualmente curioso e tolerante com os costumes
diferentes dos seus. Seu senso de observação e sua capacidade de narrar também
não são menos digno de elogios. Caminha é tão honesto na observação dos fatos,
que relata na carta, as dúvidas que porventura tenha tido. Enfim é um texto de
imprescindível leitura para aqueleque queira entender o descobrimento do
Brasil.

Semana de Arte Moderna (1922)

Semana de Arte Moderna (1922)

Fonte:Encarta-BR

Arte moderna, Semana de, evento de 1922 que representa uma renovação de linguagem, a busca de experimentação, a liberdade criadora e a ruptura com o passado.

Oficialmente, o movimento modernista irrompe, no Brasil, com a Semana de Arte Moderna que, em de três festivais realizados no Teatro Municipal de São Paulo, apresenta as novas idéias artísticas. A nova poesia através da declamação. A nova música por meio de concertos. A nova arte plástica exibida em telas, esculturas e maquetes de arquitetura. O adjetivo "novo", marcando todas estas manifestações, propunha algo a ser recebido com curiosidade ou interesse.

Não foi assim. Na principal noite da semana, a segunda, enquanto Menotti Del Picchia expunha as linhas e objetivos do movimento e Mário de Andrade recitava sua Paulicéia desvairada, inclusive a Ode ao burguês, a vaia era tão grande que não se ouvia, do palco, o que Paulo Prado gritava da primeira fila da platéia. O mesmo aconteceu com Os sapos, de Manuel Bandeira, que criticava o parnasianismo. Sob um coro de relinchos e miados, gente latindo como cachorro ou cantando como galo, Sérgio Milliet nem conseguiu falar. Oswald de Andrade debochou do fato, afirmando que, naquela ocasião, revelaram-se "algumas vocações de terra-nova e galinha d'angola muito aproveitáveis".

A semana era o ápice, ruidoso e espetacular, de uma não menos ruidosa e provocativa tomada de posição de jovens intelectuais paulistas contra as práticas artísticas dominantes no país. Práticas que, embora aceitas e mantidas, mostravam-se esgotadas para expressar o tempo de mudanças em que viviam. A fala de Menotti del Picchia, afirmando que a estética do grupo era de reação e, como tal, guerreira, não deixava margem à dúvidas: "Queremos luz, ar, ventiladores, aeroplanos, reivindicações obreiras, idealismos, motores, chaminés de fábricas, sangue, velocidade, sonho em nossa arte. Que o rufo de um automóvel, nos trilhos de dois versos, espante da poesia o último deus homérico, que ficou anacronicamente a dormir e a sonhar, na era do jazz band e do cinema, com a flauta dos pastores da Arcádia e os seios divinos de Helena".

Antecedentes

Vários fatos contribuiram para a Semana de Arte Moderna de 1922. Em 1912, Oswald de Andrade chega da Europa influenciado pelo Manifesto futurista de Marinetti, funda o irreverente jornal O Pirralho e, em suas páginas, critica a pintura nacional. O pintor russo Lasar Segall, em 1913, desembarca em São Paulo com um estilo não acadêmico, inovador e de cunho expressionista. Annita Malfatti, em 1914, após mostrar seus trabalhos ligados aos impressionistas alemães, decide estudar nos Estados Unidos. Em 1917 - ano de grande agitação político-social, greves e tumultos marcando as lutas do operariado paulista -, inaugura-se a nova exposição de Anita Malfatti, impiedosamente criticada por Monteiro Lobato no artigo Paranóia ou mistificação. Menotti del Picchia publica Juca mulato, um canto de despedida à era agrária diante da urbanização nascente. Em 1920, Oswald de Andrade diz que, no ano do centenário da independência, os intelectuais deveriam fazer ver que "a independência não é somente política, é acima de tudo independência mental e moral".

A estes episódios, somavam-se as idéias vindas do exterior. Do início do século XX ao momento em que foi deflagrada a semana, 21 movimentos culturais haviam ocorrido no Ocidente:

— Fauvismo, 1905.

— Expressionismo, 1906.

— Cubismo, 1907.

— Futurismo, 1909.

— Raionismo, 1911.

— Orfismo, 1912.

— Cubo-futurismo, 1912.

— Suprematismo, 1912.

— Não-objetivismo, 1913.

— Vorticismo, 1913.

— Imaginismo, 1914.

— Dadaísmo, 1916.

— Neoplasticismo, 1917.

— Ultraísmo, 1918.

— Bauhaus, 1919.

— Espírito-Novo, 1920.

— Pintura metafísica, 1920

— Musicalismo, 1920.

— a Neue Schlichkeit, 1922.

— Manifesto dos pintores mexicanos (Siqueiros, Orozco, Rivera. 1922).

— Nova objetividade, 1922.

A semana coincide com a Nova objetividade e com o manifesto dos mexicanos, mas seu ideário estava mais ligado a 1909. Embora rejeitassem a denominação de "futuristas", esta doutrina se ajusta à paisagem paulistana do momento e lhes dá instrumentos de trabalho para as idéias renovadoras que visavam implantar.

O contexto político-social em que ocorre a semana é, também, de agitação e mudanças. As sucessivas crises da economia cafeeira, sustentáculo da vida republicana, haviam abalado o prestígio social da aristocracia rural paulista. Ao mesmo tempo, expande-se a industrialização com conseqüente urbanização e maior mobilidade social. A pequena burguesia, que subira à cena política no início da república (1889), começa a dar sinais de inquietação. A grande burguesia se divide, com um segmento investindo na indústria nascente e hostilizando o segmento agrário que ainda controla o poder público.

Composição do grupo modernista

É neste contexto conturbado que se compõe o grupo modernista. Entre outros, dele fazem parte os prosadores e poetas Oswald de Andrade, Mário de Andrade, Menotti Del Picchia, Guilherme de Almeida, Agenor Barbosa, Plínio Salgado, Cândido Motta Filho e Sérgio Milliet. Os pintores Anita Malfatti, Di Cavalcanti, Vicente do Rego Monteiro e John Graz. Os escultores Victor Brecheret e W. Haeberg. Os arquitetos Antonio Moya e George Przirembel. Em preparação à semana, um grupo vem ao Rio de janeiro para buscar a adesão de artistas que consideravam simpatizantes às idéias modernizadoras: Manuel Bandeira, Renato Almeida, Villa-Lobos, Ronald de Carvalho, Álvaro Moreyra e Sérgio Buarque de Hollanda.

Programa do modernismo

1921 marca o início da busca de abrir terreno às idéias novas:

— Rejeição das concepções estéticas e práticas artísticas românicas, parnasianas e realistas.

— Independência mental brasileira e recusa às tendências européias em moda nos meios cultos conservadores.

— Elaboração de novas formas de expressão, capazes de apreender e representar os problemas contemporâneos.

— Transposição, para a arte, de uma realidade viva: conflitos, choques, variedade e tumulto, expressões de um tempo e uma sociedade.

Estas idéias se desdobram com o crescer do movimento, gerando os mais diversos caminhos: a poesia pau-brasil, o verde-amarelismo, a antropofagia (ver Antropofagia cultural), o regionalismo, a reação espiritualista e a consciência social.

Mário de Andrade, em estudo que levanta alarido e protestos, analisa Os mestres do passado, criticando os ídolos do tempo: Francisca Júlia, Raimundo Correia, Alberto de Oliveira, Olavo Bilac e Vicente de carvalho. Oswald de Andrade, no artigo O meu poeta futurista, provoca reações transcrevendo versos de Mário, dentro da estética inovadora (ver Poesia moderna brasileira).

Os festivais da semana, reunindo o grupo rebelde, ecoam a divisão dos grupos artísticos ligados ao passado e introduzem as coordenadas culturais da nova era, o mundo da técnica e do progresso que o modernismo glorifica para, depois, criticar por suas conseqüências na esfera política e social.

Contradição fatal

"A aristocracia tradicional nos deu mão forte", confessa Mário de Andrade. "Dois palhaços da burguesia, um paranaense, outro internacional - Emílio de Menezes e Blaise Cendrars - me fizeram perder tempo", diz Oswald. "Fui com eles um palhaço de classe", apontam ambos, com lucidez intelectual, para a contradição que só do tempo faria evidente: esteticamente revolucionário, o movimento traria ou aprofundaria conquistas - o verso livre, por exemplo - que se tornariam definitivas. Uma nova visão e conceituação do fenômeno poético, da concepção da forma, da função das imagens e de todos os recursos técnicos de expressão artística. Assim obteriam, como afirma Mário de Andrade no mesmo balanço autocrítico, "direito à pesquisa estética livre de cânones limitadores; a atualização da inteligência artística brasileira e a estabilização de uma consciência criadora nacional.

Por volta de 1930, o movimento triunfante completa a ruptura com as tradições conservadoras e acadêmicas, abrindo o caminho a novas perspectivas e rumos, trilhadas pelas gerações seguintes. Na ferina expressão de Franklin de Oliveira, a Semana de Arte Moderna foi "uma revolução que não saiu dos salões". Sublinhando a autocrítica dos principais líderes do modernismo, Franklin afirma que os modernistas "não pegaram "a máscara do tempo, para esbofeteá-la, como ela merecia ". Esta posição levou o grupo a acreditar que nada havia feito de útil. As palavras de Mário de Andrade definem este sentimento: "Eu creio que os modernistas da Semana de Arte Moderna não devemos servir de exemplo a ninguém. Mas podemos servir de lição."

Memórias Póstumas de Brás Cubas - resumo e análise da obra de Machado de Assis

Memórias Póstumas de Brás Cubas - resumo e análise da obra de Machado de Assis

Ao criar um narrador que resolve contar sua vida depois de morto, Machado de Assis muda radicalmente o panorama da literatura brasileira, além de expor de forma irônica os privilégios da elite da época
Publicado em 1881, o livro aborda as experiências de um filho abastado da elite brasileira do século XIX, Brás Cubas. Começa pela sua morte, descreve a cena do enterro, dos delírios antes de morrer, até retornar a sua infância, quando a narrativa segue de forma mais ou menos linear – interrompida apenas por comentários digressivos do narrador.

NARRADOR
A narração é feita em primeira pessoa e postumamente, ou seja, o narrador se autointitula um defunto-autor – um morto que resolveu escrever suas memórias. Assim, temos toda uma vida contada por alguém que não pertence mais ao mundo terrestre. Com esse procedimento, o narrador consegue ficar além de nosso julgamento terreno e, desse modo, pode contar as memórias da forma como melhor lhe convém.

FOCO NARRATIVO
Com a narração em primeira pessoa, a história é contada partindo de um relato do narrador-observador e protagonista, que conduz o leitor tendo em vista sua visão de mundo, seus sentimentos e o que pensa da vida. Dessa maneira, as memórias de Brás Cubas nos permitirão ter acesso aos bastidores da sociedade carioca do século XIX.

TEMPO
A obra é apoiada em dois tempos. Um é o tempo psicológico, do autor além-túmulo, que, desse modo, pode contar sua vida de maneira arbitrária, com digressões e manipulando os fatos à revelia, sem seguir uma ordem temporal linear. A morte, por exemplo, é contada antes do nascimento e dos fatos da vida.

No tempo cronológico, os acontecimentos obedecem a uma ordem lógica: infância, adolescência, ida para Coimbra, volta ao Brasil e morte. A estranheza da obra começa pelo título, que sugere as memórias narradas por um defunto. O próprio narrador, no início do livro, ressalta sua condição: trata-se de um defunto-autor, e não de um autor defunto. Isso consiste em afirmar seus méritos não como os de um grande escritor que morreu, mas de um morto que é capaz de escrever.

O pacto de verossimilhança sofre um choque aqui, pois os leitores da época, acostumados com a linearidade das obras (início, meio e fim), veem-se obrigados a situar-se nessa incomum situação.
ENREDO
A infância de Brás Cubas, como a de todo membro da sociedade patriarcal brasileira da época, é marcada por privilégios e caprichos patrocinados pelos pais. O garoto tinha como “brinquedo” de estimação o negrinho Prudêncio, que lhe servia de montaria e para maus-tratos em geral. Na escola, Brás era amigo de traquinagem de Quincas Borbas, que aparecerá no futuro defendendo o humanitismo, misto da teoria darwinista com o borbismo: “Aos vencedores, as batatas”, ou seja: só os mais fortes e aptos devem sobreviver.

Na juventude do protagonista, as benesses ficam por conta dos gastos com uma cortesã, ou prostituta de luxo, chamada Marcela, a quem Brás dedica a célebre frase: “Marcela amou-me durante quinze meses e onze contos de réis”. Essa é uma das marcas do estilo machadiano, a maneira como o autor trabalha as figuras de linguagem. Marcela é prostituta de luxo, mas na obra não há, em nenhum momento, a caracterização nesses termos. Machado utiliza a ironia e o eufemismo para que o leitor capte o significado. Brás Cubas não diz, por exemplo, que Marcela só estava interessada nos caros presentes que ele lhe dava. Ao contrário, afirma categoricamente que ela o amou, mas fica claro que, naquela relação, amor e interesse financeiro estão intimamente ligados.

Apaixonado por Marcela, Brás Cubas gasta enormes recursos da família com festas, presentes e toda sorte de frivolidades. Seu pai, para dar um basta à situação, toma a resolução mais comum para as classes ricas da época: manda o filho para a Europa estudar leis e garantir o título de bacharel em Coimbra.

Brás Cubas, no entanto, segue contrariado para a universidade. Marcela não vai, como combinara, despedir-se dele, e a viagem começa triste e lúgubre.

Em Coimbra, a vida não se altera muito. Com o diploma nas mãos e total inaptidão para o trabalho, Brás Cubas retorna ao Brasil e segue sua existência parasitária, gozando dos privilégios dos bem-nascidos do país.

Em certo momento da narrativa, Brás Cubas tem seu segundo e mais duradouro amor. Enamora-se de Virgília, parente de um ministro da corte, aconselhado pelo pai, que via no casamento com ela um futuro político. No entanto, ela acaba se casando com Lobo Neves, que arrebata do protagonista não apenas a noiva como também a candidatura a deputado que o pai preparava.

A família dos Cubas, apesar de rica, não tinha tradição, pois construíra a fortuna com a fabricação de cubas, tachos, à maneira burguesa. Isso não era louvável no mundo das aparências sociais. Assim, a entrada na política era vista como maneira de ascensão social, uma espécie de título de nobreza que ainda faltava a eles.

NÃO-REALIZAÇÕES
O romance não apresenta grandes feitos, não há um acontecimento significativo que se realize por completo. A obra termina, nas palavras do narrador, com um capítulo só de negativas. Brás Cubas não se casa; não consegue concluir o emplasto, medicamento que imaginara criar para conquistar a glória na sociedade; acaba se tornando deputado, mas seu desempenho é medíocre; e não tem filhos.

A força da obra está justamente nessas não-realizações, nesses detalhes. Os leitores ficam sempre à espera do desenlace que a narrativa parece prometer. Ao fim, o que permanece é o vazio da existência do protagonista. É preciso ficar atento para a maneira como os fatos são narrados. Tudo está mediado pela posição de classe do narrador, por sua ideologia. Assim, esse romance poderia ser conceituado como a história dos caprichos da elite brasileira do século XIX e seus desdobramentos, contexto do qual Brás Cubas é, metonimicamente, um representante.

O que está em jogo é se esses caprichos vão ou não ser realizados. Alguns exemplos: a hesitação ao começar a obra pelo fim ou pelo começo; comparar suas memórias às sagradas escrituras; desqualificar o leitor: dar-lhe um piparote, chamá-lo de ébrio; e o próprio fato de escrever após a morte. Se Brás Cubas teve uma vida repleta de caprichos, em virtude de sua posição de classe, é natural que, ao escrever suas memórias, o livro se componha desse mesmo jeito.

O mais importante não é a realização ou não dessas veleidades, mas o direito de tê-las, que está reservado apenas a uns poucos da sociedade da época. Veja-se o exemplo de Dona Plácida e do negro Prudêncio. Ambos são personagens secundários e trabalham para os grandes. A primeira nasceu para uma vida de sofrimentos: “Chamamos-te para queimar os dedos nos tachos, os olhos na costura, comer mal, ou não comer, andar de um lado pro outro, na faina, adoecendo e sarando…”, descreve Brás. Além da vida de trabalhos e doenças e sem nenhum sabor, Dona Plácida serve ainda de álibi para que Brás e Virgília possam concretizar o amor adúltero numa casa alugada para isso.

Com Prudêncio, vê-se como a estrutura social se incorpora ao indivíduo. Ele fora escravo de Brás na infância e sofrera os espancamentos do senhor. Um dia, Brás Cubas o encontra, depois de alforriado, e o vê batendo num negro fugitivo. Depois de breve espanto, Brás pede para que pare com aquilo, no que é prontamente atendido por Prudêncio. O ex-escravo tinha passado a ser dono de escravo e, nessa condição, tratava outro ser humano como um animal. Sua única referência de como lidar com a situação era essa, afinal era o modo como ele próprio havia sido tratado anteriormente. Prudêncio não hesita, porém, em atender ao pedido do ex-dono, com o qual não tinha mais nenhum tipo de dívida nem obrigação a cumprir.

CONCLUSÃO
Machado alia nesse romance profundidade e sutileza, expondo muitos problemas de nossa sociedade que existem até hoje. Daí o prazer da leitura e a importância de seu texto, pois atualiza, de forma irônica, os processos em que nosso país foi formado, suas contradições e os desmandos que ainda estão presentes.

7.29.2011

O MULATO - Aluísio Azevedo (Resumo)

O MULATO - Aluísio Azevedo (Resumo)


Acessando o link abaixo, o leitor tem acesso a leitura sobre a Vida e livros deste importante representante da literatura brasileira.
Principais romances: O Mulato, O Cortiço e Casa de Pensão.

http://www.suapesquisa.com/biografias/aluisiodeazevedo/

Resumo do Livro:

Saindo criança de São Luís para Lisboa, Raimundo viajava órfão de pai, um ex-comerciante português, e afastado da mãe, Domingas, uma ex-escrava do pai.
Depois de anos na Europa, Raimundo volta formado para o Brasil. Passa um ano no Rio e decide regressar a São Luís para rever seu tutor e tio, Manuel Pescada.
Bem recebido pela família do tio, Raimundo desperta logo as atenções de sua prima Ana Rosa que, em dado momento, lhe declara seu amor.
Essa paixão correspondida encontra, todavia, três obstáculos: o do pai, que queria a filha casada com um dos caixeiros da loja; o da avó Maria Bárbara, mulher racista e de maus bofes; o do Cônego Diogo, comensal da casa e adversário natural de Raimundo.

Todos três conheciam as origens negróides de Raimundo. E o Cônego Diogo era o mais empenhado em impedir a ligação, uma vez que fora responsável pela morte do pai do jovem.

Foi assim: depois que Raimundo nasceu, seu pai, José Pedro da Silva, casou-se com Quitéria Inocência de Freitas Santiago, mulher branca. Suspeitando da atenção particular que José Pedro dedicava ao pequeno Raimundo e à escrava Domingas, Quitéria ordena que açoitem a negra e lhe queimem as partes genitais.

Desesperado, José Pedro carrega o filho e leva-o para a casa do irmão, em São Luís. De volta à fazenda, imaginando Quitéria ainda refugiada na casa da mãe, José Pedro ouve vozes em seu quarto. Invadindo-o, o fazendeiro surpreende Quitéria e o então Padre Diogo em pleno adultério.

Desonrado, o pai de Raimundo mata Quitéria, tendo Diogo como testemunha. Graças à culpa do adultério e à culpa do homicídio, forma-se um pacto de cumplicidade entre ambos. Diante de mais essa desgraça, José Pedro abandona a fazenda, retira-se para a casa do irmão e adoece.
Algum tempo depois, já restabelecido, José Pedro resolve voltar à fazenda, mas, no meio do caminho, é tocaiado e morto. Por outro lado, devagarzinho, o Padre Diogo começara a insinuar-se também na casa de Manuel Pescada.
Raimundo ignorava tudo isso.

Em São Luís, já adulto, sua preocupação básica é a de desvendar suas origens e, por isso, insiste com o tio em visitar a fazenda onde nascera. Durante o percurso a São Brás, Raimundo começa a descobrir os primeiros dados sobre suas origens e insiste com o tio para que lhe conceda a mão de Ana Rosa. Depois de várias recusas, Raimundo fica sabendo que o motivo da proibição devia-se à cor de sua pele.
De volta a São Luís, Raimundo muda-se da casa do tio, decide voltar para o Rio, confessa em carta a Ana Rosa seu amor, mas acaba não viajando.
Apesar das proibições, Ana Rosa e ele concertam um plano de fuga. No entanto, a carta principal fora interceptada por um cúmplice do Cônego Diogo, o caixeiro Dias, empregado de Manuel Pescada e forte pretendente, sempre repelido, à mão de Ana Rosa.
Na hora da fuga, os namorados são surpreendidos. Arma-se o escândalo, do qual o cônego é o grande regente. Raimundo retira-se desolado e, ao abrir a porta de casa, um tiro acerta-o pelas costas. Com uma arma que lhe emprestara o Cônego Diogo, o caixeiro Dias assassina o rival.
Ana Rosa aborta.
Entretanto, seis anos depois, vemo-la saindo de uma recepção oficial, de braço com o Sr. Dias e preocupada com os "três filhinhos que ficaram em casa, a dormir".

Aspectos Relevantes

É apontado como a obra inaugural do Naturalismo no Brasil (1881). Podem ser identificados alguns elementos naturalistas:

A CRÍTICA SOCIAL, através da sátira impiedosa dos tipos de São Luís: o comerciante rico e grosseiro, a velha beata e raivosa, o padre relaxado e assassino, e uma série de personagens que resvalam sempre para o imoral e para o grotesco. Já dissemos que esses tipos são, muitas vezes, pessoas que realmente viveram em São Luís, conhecidas pelo autor.

ANTICLERICALISMO, projetado na figura do padre e depois cônego Diogo, devasso, hipócrita e assassino.

OPOSIÇÃO AO PRECONCEITO RACIAL, que é o fulcro de toda a trama.

O ASPECTO SEXUAL, referido expressamente em relação à natureza carnal da paixão de Ana Rosa pelo mulato Raimundo.

O TRIUNFO DO MAL, já que, no desfecho, os crimes ficam impunes e os criminosos são gratificados: a heroína acaba se casando com o assassino de Raimundo (grande amor de sua vida), e o Pe. Diogo, responsável por dois crimes, é promovido a cônego.
Contudo, há fortes resíduos românticos:
Escrito em plena efervescência da Campanha Abolicionista, Aluísio Azevedo não manteve a postura neutra, imparcial, que caracteriza os autores realistas/naturalistas.

Ao contrário, ele toma partido do mulato, do homem de cor, idealizando exageradamente Raimundo, que mais parece o herói dos romances românticos (ingênuo, bondoso, ama platonicamente Ana Rosa e ignora a sua condição de homem de cor).

Observe que Raimundo é cientificamente inverossímel (filho de pai branco e mãe negra retinta, o filho tem "grandes olhos azuis, cabelos pretos e lustrosos, tez morena e amulatada, mas fina").
A trama da narração é romântica e desenvolve o velho chavão romântico da história de amor que as tradições e o preconceito impedem de se realizar. Além disso, a história é verdadeiramente rocambolesca (= complicada, "enrolada").

TEXTO I

Observe, na descrição de Raimundo, a idealização própria dos romancistas românticos, a superioridade absoluta: moral, intelectual e mesmo física:
"Raimundo tinha vinte e seis anos e seria um tipo acabado de brasileiro, se não foram os grandes olhos azuis, que puxara do pai.

Cabelos muito pretos, lustrosos e crespos,, tez morena e amulatada, mas fina,- dentes claros que reluziam sob a negrura do bigode, estatura alta e elegante, pescoço largo, nariz direito e fronte espaçosa.

A parte mais característica de sua fisionomia era os olhos grandes, ramalhudos, cheios de sombras azuís, pestanas eriçadas e negras, pálpebras de um roxo vaporoso e úmido,- as sobrancelhas, muito desenhadas no rosto, como a nanquim, faziam sobressair a frescura da epiderme, que, no lugar da barba raspada, lembrava os tons suaves e transparentes de uma aquarela sobre papel de arroz.
Tinha os gestos bem educados, sóbrios, despidos de pretensão, falava em voz baixa, distintamente, sem armar ao efeito, vestia-se com seriedade e bom gosto; amava os artes, as ciências, a literatura e, um pouco menos, a política."

TEXTO II

Observe no texto abaixo a caracterização dos costumes da província, dos mexericos e do preconceito, manifesto na "fofoca" de que participam D. Bibina, Lindoca, D. Maria do Carmo e Amância Souselas:
"- Ele não é feio... a senhora não ache, D. Bibina ?... segredava Lindoca à outra sobrinha de D. Maria do Carmo, olhando furtivamente para o lado de Raimundo.
- Quem? O primo d’Ana Rosa?
- Primo? Eu creio que ele não é primo, dona !
- É! sustentou Bibina, quase com arrelie. É primo sim, por parte de pai !...
Por outro lado, María do Carmo segredava a Amâncla Souselas:
- Pois é o que lhe digo, D. Amáncía: muito boa preta!... negra como este vestido! Cá está quem a conheceu!...
E batia no seu peito sem seios. - Muita vez a vi no relho. Iche !
- Ora quem houvera de dizer!... resmungou a outro, fingindo ignorar da existência de Domingas, para ouvir mais. Uma coisa assim só no Maranhão! Credo!"

TEXTO III

Observe a nitidez com que o autor retrata o ambiente da cidade (descrição de São Luiz):
"Era um dia abafadiço e aborrecido. A pobre cidade de São Luís do Maranhão parecia entorpecida pelo calor.

Quase que se não podia sair à rua: as pedras escaldavam, os vidraças e os lampiões faiscavam ao sol como enormes diamantes, as paredes tinham reverberações de prata polida; os folhas das árvores nem se mexiam; os carroças d’água passavam ruidosamente a todo o instante, abalando os prédios, e os aguadeiros, em mangas de camisa e pernas arregaçados, invadiam sem cerimônia as casas para encher as banheiras e os potes.

Em certos pontos não se encontra vã viva alma no rua; tudo estava concentrado, adormecido; só os pretos faziam as compras para o jantar ou andavam no ganho."

Por: Olhar Literário

Fonte:

http://www.mundovestibular.com.br/

Os Sertões - Síntese da Obra :Rodolpho José Del Guerra

Os Sertões - Síntese da Obra

Rodolpho José Del Guerra



O livro Os Sertões, quase todo escrito em São José do Rio Pardo (pelo menos 75%), foi, no dizer de Euclides da Cunha, "escrito nos raros intervalos de folga de uma carreira fatigante".

É uma obra difícil: vocabulário incomum, assuntos áridos, temas científicos, necessitando-se do dicionário e de bibliografia paralela. A cada leitura de Os Sertões, descobrimos coisas novas, que passaram despercebidas na análise anterior.

N'Os Sertões, Euclides se mostra como cientista e artista; o cientista é o engenheiro, o bacharel em matemática, ciências físicas e naturais; o artista é o poeta, o sonhador, o estudioso sensível, "que se lançou à Escola da Praia-Vermelha". Como cientista, ele nos informa com a precisão de um sábio versátil; como artista, ele nos convence e nos encanta com suas palavras transformadas em cores, formas, movimentos, sentimentos...

Este resumo tem a finalidade de preparar o pequeno aluno e o iniciante estudioso de Euclides para a leitura da grande obra, dividida em três partes: A Terra, O Homem, A Luta.



I. A TERRA



Aqui, vejo Euclides como um diretor de teatro, verificando o grande palco, para apresentar sua peça brasileira. O palco é o sertão da Bahia. Localiza-o e preocupa-se com todos os detalhes do cenário, em constante mutação, com córregos e rios que secam ou transbordam; com tempestades que se formam em paraíso, dando lugar à flora tropical... Analisa todos os detalhes antes de fazer entrar em cena muitos personagens diferentes, e os soldados das quatro expedições para se iniciar a luta.

E começa o espetáculo, apresentando o planalto central nesta primeira parte do livro, com seus diferentes relevos: no sul litorâneo, as maiores altitudes; em Minas Gerais, as montanhas mais altas entram pelo interior e, caminhando para o norte, na Bahia, o aplainamento geral. Nesta região, está o sertão, com uma ondulação de montanhas baixas, limitado pelo rio São Francisco ao norte e ocidente e, ao sul, pelo rio Itapicuru.

Desconhecido e sempre evitado, esse sertão tem um solo seco, sem umidade, estéril, queimado pelas secas e um clima hostil. Euclides escreve: "(...) tem a impressão persistente de calcar o fundo recém-sublevado de um mar extinto".

Alguns rios que o cortam transbordam nas chuvas e somem nas secas, deixando, de longe em longe, algumas poças de água no seu leito. O mais importante deles é o Vaza-Barris que, numa de suas curvas, banha Canudos, rodeada de montanhas.

O clima do sertão é instável: dias tórridos e noites geladas. O ar é seco e essa secura foi descrita em "Higrômetros singulares". Num trabalho de 1974, a professora Célia Mariana Franchi Fernandes da Silva escreveu: "(...) os cadáveres de um soldado e de um cavalo, mortos na peleja, depois de três meses estavam ainda em perfeito estado, apenas ressequidos como múmias".

As secas são cíclicas e assolam a região. Dizem os caboclos que se as chuvas não vierem de 12 de dezembro a 19 de março, haverá seca o ano todo.

A travessia da caatinga, com sua vegetação resistente, com suas árvores sem folhas, com espinhos e "os gravetos estalados em lanças", é "mais exaustiva que a de uma estepe nua". Na caatinga estão os cajuís, macambiras, caroás, favelas, juazeiros, xiquexiques..., sendo algumas dessas plantas reservatórios de água.

Quando vem a tormenta, o sertão se transforma em paraíso: ressurge a flora, com seu verde, suas flores exuberantes à beira das cacimbas. Ressurge a fauna: catitus, queixadas, emas, seriemas, sericóias, suçuaranas...

No final da primeira parte, Euclides comenta que os sertões do norte não se enquadram em apenas uma categoria geográfica do filósofo alemão Hegel, ou seja: no verão, vestem-se de "estepes de vegetação tolhiça, ou vastas planícies áridas"; no inverno, com as chuvas, transformam-se em "vales férteis, profusamente irrigados". No sertão, as duas categorias se apresentam numa mesma estação.

No capítulo "Como se faz um deserto", o autor cita o homem assumindo "em todo o decorrer da história, o papel de um terrível fazedor de desertos", através do fogo, das queimadas. E apresenta a solução: açudes, que aumentarão a evaporação e as chuvas, como fizeram os romanos em Cartago.





II. O HOMEM



Nesta segunda parte, os personagens entram em cena: jagunços, sertanejos, o Conselheiro..., isolados há séculos no sertão, o que provocou sua estagnação cultural.

Levados pelo texto, adentramos Canudos e, com a multidão, vamos participar de suas tradições, danças, desafios, e da sua religião mestiça.

Euclides da Cunha estuda a gênese, a formação do brasileiro, resultante dos cruzamentos entre o indígena, o negro e o português. Desta mistura, por muitos motivos, não resulta um tipo étnico único para o Brasil: "(...) não temos unidade de raça".

Historicamente, os cruzamentos entre portugueses e negros se realizaram no litoral, porque o negro vinha para o trabalho escravo nos canaviais da costa brasileira. Entre portugueses e índios, realizaram-se no sertão, pois os gentios se refugiavam no agreste do interior, avessos ao trabalho por razões culturais.

Para o estudo da formação étnica do sertanejo, Euclides estuda o povoamento das regiões banhadas pelo rio São Francisco. O sul foi povoado pelos bandeirantes; a região média, pelos vaqueiros, e no norte seco, pelas missões jesuíticas.

As cidades que margeiam o sertão de Canudos são originárias de missões e aldeamento de índios, como atestam seus nomes: Panibu, Patamoté, Uauá, Bendegó, Cumbe, Jeremoabo... Seus habitantes resultam de cruzamentos, com predominância do índio sobre o branco e sobre o negro.

Isolados pelo deserto, sua mestiçagem foi uniforme. Embora a mistura de raças diferentes seja prejudicial, os sertanejos formaram uma raça forte.

O isolamento de um povo fortalece a espécie, mas é fator determinante da estagnação, provocando o atraso, o conservadorismo, a igualdade de pensar, de sentir, de agir... O isolamento torna-se retrógrado, mas não degenerado.

(Abro parênteses para esclarecer que não só Euclides foi criticado por erros como os que se seguem: os males do cruzamento, os esmagamento total das raças fracas... Outros autores o foram. Euclides se baseava na teoria racial do final do século XIX, que afirmava ser a raça branca sinônimo de progresso, condenando a miscigenação...)

"O sertanejo é, antes de tudo, um forte. Não tem o raquitismo exaustivo dos mestiços do litoral. A sua aparência, entretanto, (...) revela o contrário. (...) É desengonçado, torto. (...) Reflete a preguiça invencível, (...). Basta o aparecimento de qualquer incidente (...) transfigura-se. (...) reponta (...) um titã acobreado e potente (...) de força e agilidade extraordinárias." Veste-se de couro, protegendo-se dos espinhos da caatinga. É vaqueiro. Sua cultura respeita antiquíssimas tradições. Torna-se um retirante, impulso pela seca cíclica, mas retorna sempre ao sertão.

Sua religião, como ele, é mestiça. O catolicismo atrasado se mistura aos candomblés do índio e do negro e se enche de superstições, crendices e temores medievais, conservados pelo isolamento, desde a colonização. Ele é crédulo, supersticioso, e esse deixa influenciar por padres, pastores e falsos profetas...

Neste ambiente, surgiu Antônio Conselheiro, que absorveu as crenças do seu meio. Fixou-se em Canudos com seus seguidores, que acreditavam na certeza de ir para o céu se mortos em combate, defendendo uma causa sagrada.

O Conselheiro, Antônio Vicente Mendes Maciel, nasceu em Quixeramobim, no Ceará. Trabalhou com o pai comerciante, que morreu ao se desentender com os Araújos, seus inimigos. Depois dos casamentos das irmãs, ele se casou logo se desiludiu com a traição da companheira. Envergonhado, mudou-se, sem se fixar: Sobral, Campo Grande, trabalhando como caixeiro e escrivão de juiz. Em Ipu, fugiu-lhe a mulher, acompanhando um soldado. Em Paus Brancos, alucinado, feriu um seu parente que o hospedara...

Desapareceu. "Morrera por assim dizer".

Reapareceu dez anos depois, nos sertões de Pernambuco e em Itabaiana (SE), em l874, impressionando os sertanejos: alto e magro, barba e cabelos desgrenhados e longos, túnica de brim americano azul, com uma corda na cintura, sandálias, alforje e chapéu de couro, ele pregava nos povoados uma doutrina confusa, que se misturava às rezas de dois catecismos que carregava "Missão Abreviada" e "Horas Marianas". Pregava o fim do mundo, a preparação para a morte, a penitência... A multidão o seguia, sem que ele a convocasse. Fazia prédicas e profecias, casamentos e batizados, reconstruía igrejas, muros de cemitérios... O clero o tolerava e procurava, deixando-o pregar, até mesmo contra a República, que interveio em áreas regidas pela tradição e reservadas à religião. Como aumentasse seu ataque, a Igreja tentou interrompê-lo.

Em Bom Conselho, reuniu o povo num dia de feira e queimou as tábuas dos impostos, discordando das leis republicanas do governo de Satanás. O acontecimento repercutiu e a polícia reagiu. Perseguido, o Conselheiro tomou a estrada de Monte Santo, defrontando-se com a tropa em Maceté. Os 30 praças armados atacaram. Os jagunços os desbarataram.

O Conselheiro - conhecedor do sertão - e seus seguidores tomaram o rumo do norte. Chegaram a Canudos, em 1893, uma fazenda abandonada às margens do rio Vaza-Barris. "Era o lugar sagrado, cingido de montanhas, onde não penetraria a ação do governo maldito"(...) "O arraial crescia vertiginosamente, coalhando as colinas", sem ordem, sem ruas: um verdadeiro labirinto, com casa de pau-a-pique, habitadas por um população multiforme, de sertanejos simples, beatas, ricos proprietários que abandonavam tudo em busca da salvação e por bandidos ali protegidos, que respeitavam as regras: rezar e fazer sacrifícios para alcançar a vida eterna. A igreja, uma fortaleza, a mais importante obra do Conselheiro, estava diante da praça. Euclides descreveu a lei mantida por facínoras, as rezas, os sermões, as danças, o dia-a-dia do aglomerado e os tipos fascinantes dos heróis: João Abade, Pajeú, João Grande, Vila Nova, Chico Taramela, Macambira, Beatinho...

Antônio Conselheiro pregava contra a República, contra o governo do Anti-Cristo e da lei do cão. "Mas não traduzia o mais pálido intento político". Os jagunços, "rudes patrícios mais estrangeiros nesta terra do que os imigrantes da Europa", não conseguiam diferenciar a República da Monarquia.

(Abro aqui um novo parêntese: algumas mudanças da nova ordem respingavam no sertão: separação Igreja-Estado, obrigatoriedade do casamento civil, cobrança de impostos pelos Estados...: coisas incompreensíveis pelos sertanejos).

E o povo versejava e cantava;

"Casamento vão fazendo/ Só pro povo iludir/ Vão casar o povo todo/ No casamento civil".

"Visita nos vem fazer/ Nosso rei D. Sebastião/ Coitado daquele pobre/ Que estiver na lei do cão".

"Eram realmente, fragílimos, aqueles pobres rebelados..."

"Requeriam outra reação. Obrigavam-nos a outra luta."

"Entretanto enviamos-lhes (...) a bala".



III. A LUTA

Os caminhos e montanhas que volteavam Canudos estavam fortificados.

O Conselheiro reinava naquela comunidade, dormindo sobre tábuas, pregando, alimentando-se com farinha...

Em outubro de 1896, o juiz de Juazeiro (BA) recusou-se a entregar a madeira encomendada para a construção da igreja nova de Canudos. O Conselheiro ameaçou invadir a cidade. Foi pedido reforço ao governo.

1ª Expedição. Em novembro de 1896, foi enviada um pequena expedição, com 104 soldados, comandados pelo Ten. Pires Ferreira. Dia 21, os jagunços os encontraram em Uauá. A tropa retrocedeu, atacada com facões, bacamartes e aguilhões de vaqueiro, e apavorada com os gritos e vivas dos conselheiristas.

Foi o prelúdio da guerra sertaneja.

2ª Expedição. o major Febrônio de Brito comandou essa expedição, com 543 soldados, 14 oficiais e 3 médicos, saindo de Monte Santo, em 12 de janeiro de 1897. Sem conhecer a guerra nas caatingas, a tropa foi inesperadamente atacada na estrada que atravessa a Serra do Cambaio. O sertanejo atraía os soldados para a caatinga, que os feria, exaurindo-os. A munição acabava, obrigando a tropa a voltar a Monte Santo. Apesar de 415 jagunços mortos, este segundo insucesso militar provocou impacto nacional.

3ª Expedição. Partiu do Rio de Janeiro, com 1.300 homens, em 3 de fevereiro de 1897, comandada pelo Cel. Moreira César. Dia 2 de março, sem um plano tático, a tropa entrou e atacou o arraial, perdendo-se naquele labirinto. Moreira César foi mortalmente ferido, com duas balas, morrendo no dia seguinte. Foi substituído pelo Coronel Pedro Nunes Tamarindo. A tropa fragmentou-se, dispersou-se, debandou em pânico, desfazendo-se de armas e munições, recolhidas pelos jagunços. O corpo de Moreira César foi jogado no caminho. Quando atravessava o córrego de Angico, querendo conter seus homens, o Cel. Tamarindo foi morto. Morreu, também, o comandante, Cap. José Agostinho Salomão da Rocha. Comoção nacional. "A República estava em perigo".

4ª Expedição. Sob o comando do General Artur Oscar, organizaram-se em 5 de abril de 1897, as forças dessa expedição; 4 brigadas em 2 colunas, com 4.283 soldados. Com roteiros diferentes, as duas colunas encontrar-se-iam em Canudos.

A 2ª coluna, comandada pelo general Cláudio do Amaral Savaget, com 2.350 homens, partiu de Jeremoabo (SE), em 16 de junho, chegando a Canudos pela Serra de Cocorobó ao norte, onde venceu os jagunços.

A 1ª coluna, comandada pelo general Artur Oscar Andrade Guimarães, seguiu pelas estradas de sempre, partindo de Monte Santo (BA) , em 19 de junho, com 1.933 soldados. foi atacada no Morro da Favela. Depois de insucessos e ataques juntou-se à 2ª coluna.

Os sertanejos foram encurralados em Canudos, resistindo à superioridade de homens e armamentos, sob os tiros da matadeira (canhão) e de dinamites.

Faltaram víveres aos soldados. Para alimentá-los muitas rezes e cavalos foram mortos na região. Logo o Ministro da Guerra, Carlos Machado Bittencourt, os abasteceu.

Completou-se o cerco de Canudos, com jagunços enfrentando fome e sede, bombardeios e incêndios.

Dia 22 de setembro de 1897, uma disenteria quase dizimou os fiéis, matando Antônio Conselheiro. Os sobreviventes defendiam a Aldeia Sagrada.

Caiu Canudos, em 5 de outubro de 1897, "ao entardecer, quando caíram seus últimos defensores, que todos morreram. Eram quatro apenas: um velho, dois homens feitos e uma criança, na frente dos quais rugiam raivosamente cinco mil soldados. (...) No dia 6 acabaram de destruir desmanchando-lhes as casas, 5.200, cuidadosamente contadas. (...)"

"Antes, no amanhecer daquele dia, comissão adrede escolhida descobrira o cadáver de Antônio Conselheiro. (...) Desenterraram-no cuidadosamente. Dádiva preciosa (...)! Fotografaram-no depois. (...)". Cortaram-lhe a cabeça. "Trouxeram depois para o litoral, onde deliravam multidões em festa, aquele crânio. (...) Ali estavam (...) as linhas essenciais do crime e da loucura..."

Leia "Os Sertões" on line!

http://www.culturabrasil.org/sintesedeosertoes.htm

7.27.2011

Inscrições para UFCG começam segunda

Inscrições para UFCG começam segunda
A Comissão de vestibular da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), divulgou nesta quarta-feira (27), a data das inscrições para o Vestibular 2012 da UFCG , que começarão a partir da próxima segunda-feira (1º) e vão até o dia 19 de agosto.

De acordo com o professor Vadilson Bueno, da Comissão da UFCG, o candidato poderá entrar na página da UFCG (www.ufcg.edu.br) e acessar o Comprov onde ele conseguirá o manual ao candidato. As inscrições estarão disponíveis exclusivamente pelo site.
A taxa de inscrição para o vestibular custará 15 reais. Os candidatos que pretendem entrar para os cursos de arte e mídia, desing e música, pagam um acréscimo no valor de 10 reais, para pagar a prova de habilitação específica.
O professor lembrou a importância de se inscrever com antecedência para não correr o risco de sobrecarregar o site. De acordo com informações, o último vestibular teve mais de 40 mil candidatos inscritos e o presidente da Comissão de Vestibular, Marcos Gama, espera um aumento significativo para este ano.
Isenção
O professor Vadilson Bueno lembrou que o candidato pode pedir carência sócio-econômica durante a inscrição. Depois disso, o candidato deve procurar o Centro de Formação de Professores do Campus de Cajazeiras ou do Campus mais próximo e apresentar a documentação provando sua carência. Cartões de benefício do Governo Federal são aceitos.
De acordo com ele, a documentação será analisada e se a carência for confirmada a taxa de inscrição desse candidato será banida.